terça-feira, 27 de março de 2012

Eu não sirvo para você.


Eu já fumei mais de um maço por dia. Não tenho o corpo de participante de "reality show", como você aprecia. Eu não compartilharia todos os meus segredos com você. Às vezes eu me questiono sobre a existência de Deus. Eu me permiti estar com mais homens do que você provavelmente pressupõe. Eu tenho um filho que não é seu. A minha mãe pode ser péssima sogra. O meu pai é bem menos previsível do que a maioria deles. Meus irmãos são admiráveis, perto deles você nunca me notaria. E você é certinho demais, bonzinho demais, malhadinho demais, perfeitinho demais... Naquela noite, muito seguro, você afagou meus cabelos, como faria um dono - dono de mim. Imediatamente eu me senti refém do seu joguinho de sedução. Eu me senti capturada por esse seu jeito metidinho, quase arrogante. Mas cuidado, meu bem: enxergo bem além dessa sua pose.

Seus olhos rasos.


Os apaixonados são uma adorável classe de tolos, de míopes e estúpidos. Mesmo a paixão sendo uma aventura arriscada, eu me apaixonei pelos seus olhos rasos, meu coração ficou ébrio, ficou cego de encantamentos por você. Então me entreguei ao meu romance mais fertil. Mas seus olhos rasos foram ficando perturbados. Seus olhos rasos foram se tornando covardes e desonestos. Seus olhos rasos foram se tornando cada vez mais rasos. Quando o seu olhar encontar o meu, a pouca dignidade que lhe resta irá agonizar até morrer afogada bem no fundo do raso de seus olhos.

Pouco


Não gosto desses meus textos curtinhos. Tão pouco de meio copo d´água. Não gosto de mergulho rápido no mar. Nem de beijo sem língua. Eu não gosto de só um pedacinha da barra de chocolate e nem de curta-metragem. Mas é melhor um pouco na mão do que muito mais voando por aí.

Meu filho.


Antes dele eu não tinha medo de montar em cavalo arisco, nem de ser assaltada, nem de cachorro de rua, nem de onda grande e nem de altura. Antes dele eu não acreditava em Deus, em perdão e nem na minha própria força. Enquanto ele dorme, eu o adimiro e sussurro: "Obrigada, meu Deus, obrigada, meu Deus, obrigada por esse presente". Às vezes me custa acreditar que essa pessoinha tão especial saiu de dentro de mim! Ele está sempre cantarolando e sorri generoso para as nossas brincadeiras, nos olhando com jeito sapeca, balbuciando gracinhas. Eu adoro conversar com ele, que me observa atento, como se compreendesse cada palavra minha. Meu filho está crescendo saudável e cada vez mais sabido. Ele me proporciona as sensações mais prazerosas e um gostinho de felicidade que jamais imaginei existir.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Cabelos e pensamentos embaraçados.


Meu pensamento embaralhado me perguntou no escuro: "Para onde está caminhando a minha vida? Onde ela está acontecendo?" Parece que desabitei a minha própria vida, eu a sinto vazia, solta, perdida. Então acordei. Acordei com o sol forte invadindo a janela, aqueceu minha cama, iluminou todo o quarto. Eu desejei estar ainda mais viva. Senti medo, senti vergonha... chorei. Observei minhas mãos, meus braços, pernas e pés. Me achei pálida, frágil, feia. Sentei na cama e pude ver Murilo, que ainda dormia em seu berço. Meu coração enlouqueceu. Doeu de felicidade.

Meu "você".


Desejarei atravessar cada poro, qualquer poro seu. Desejarei que você me faça mais. Vou sentir que você é a melhor parte de mim. Vou sussurar para você e por você. Eu desejo te olhar, decidida, te hipnotizar de mim. Já sei que vai ser assim com você. Refém do seu corpo, envolvida em seu abraço, vou ficar entregue, leve. Mas, preste atenção, quero que seja sempre assim: meu olhar, seu olhar, quase saciados, prontos para ser "dois". A expectativa dessa felicidade me deixa arrepiada e o seu cheiro me fará sentir amor por você.

Amamentar.


Amamentar foi dolorido, sacrificante, monótono e cansativo. Mas não conheci nada mais gostoso que testemunhar os olhinhos do meu filho me fitando com semblante tranquilo enquanto sugava meu seio.

Zuuuummmm...


Essa noite o mosquitinho do ciúme me picou e fui contaminada. Acordei com a febre da marternidade possessiva. Quero-o somente em meus braços. Quero que só faça gracinhas para mim. Quero que só perceba o meu cheiro e só reconheça a minha voz. "Por favor, doutor, me vê aí uma injeção de lucidez!"

Meu samba de uma nota só-zinha.



Acho que estou sofrendo de "solidão critiva". Sinto vontades súbitas de escrever, rascunhar, as mãos até formingam... Quero escrever e escrever, para tentar colorir minha solidão, essa minha solidão disfarçada, tímida, sizuda. Vontade de multicolorir esse meu sorriso amarelo, sem graça. Se me encaro no espelho, meus olhos confirmam o óbvio: a dor que sinto sou eu quem sinto. E lá vou eu, tropeçando em meus pensamentos enquanto filosofo sobre a minha própria dor.